"O personagem vive a vida, que devia ser a nossa, a vida que recusamos. Outra verdade, que julgo definitiva, é a seguinte: a alegria não pertence ao teatro. Pode-se medir a força de uma peça e a sua pureza teatral pela capacidade de criar desesperos. O teatro ou é desesperado ou não é teatro".
Nelson Rodrigues

sábado, 17 de novembro de 2007

Paincakes

Cena 1:

Um cubículo de elevador laranja, ventilação no teto, pessoas entram.... todos se espremem para caber... sobe um pouco e pára. Falta de ar, vertigem, mãos trêmulas, suor, taquicardia.... Por um segundo perco o prumo, saio de onde estou e me projeto num futuro tenebroso, morte, vazio....

(grito surdo)

Volto para o elevador, olho em volta e, por enquanto, nenhuma ameaça iminente.

A respiração retoma seu ritmo pausado, vem e vai, o suor pinga, o coração esquenta de novo. Ainda sou eu... embora só um sopro de eu.


Cena 2:

Restaurante lotado, todos conversam descontraidamente, pedem seus pratos com uma naturalidade e uma certeza que a ameaçam, ela que é frágil, que é só sopro de eu. E se o sopro faltar na hora de comer, se ela se esquecer de respirar, se esquecer que existe? Os minutos passam e a descontração vai dando lugar a uma tensão não esperada no ambiente. Através de seus olhos os outros olhares se transformam, se tornam ameaçadores, cobram que ela tenha mais consistência do que seu castelo de areia pode suportar. Ela é uma ficção. Duvida de si própria. Por alguns segundos tem vontade de sair correndo...

Gentilmente o garçom coloca o prato à sua frente ... é a hora do juízo final. Será que ela conseguirá sustentar sua ficção diante de tantos juízes que avaliam sua capacidade de ser alguém?

Em sua cabeça um turbilhão, uma luta entre o sopro e o que ela não consegue esconder, cai a primeira gota de suor, ela com um sorriso amarelo passa a mão pela testa, não, ninguém percebeu, acharam que ela estava sendo simpática, poderia até ser.... ninguém saberá que suas mãos estão geladas, não perceberão que nos poucos segundos entre a chegada do prato e a primeira garfada ela já deixara de ser ela algumas vezes - não notaram que ela perdera o controle, retomando-o logo em seguida, como uma amazona que conhece os movimentos bruscos de seu cavalo, dando um toque de graciosidade àquilo que escapa ao controle. Os juízes aplaudem sua destreza com o animal.

Aos olhos dos outros, a morte dela é absolutamente imperceptível.

Última garfada. Ela sente orgulho de si pois mais uma vez o sopro não sucumbiu diante da tempestade que a atormenta de tempos em tempos. Sua expressão volta a ser serena e descontraída, os outros voltam a ser somente outros, um prato de comida somente um prato de comida, já não é mais capaz de provocar sua extinção. Ela sorri porque pode aguardar feliz a próxima refeição.

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Crimes e pecados

- Eu gosto de estimulação mental...
- Já experimentou eletrochoque?

(Woody Allen)

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

De Ibitipoca à sublimação

Vou para Ibitipoca de bicicleta... sozinha... corro para chegar antes do anoitecer. No caminho, uma bela paisagem, um precipício e uma rocha que parece ser de marte, coloco meus pés sobre ela e tiro uma foto (do pé sobre a rocha). Chego no lugar prometido, a pousada do Jan (dono do Vegan), pelo preço que paguei, uns 20 reais, fico num quarto com outras 10 pessoas, fico um pouco decepcionada, pois achei que ficaria num quarto só pra mim. Uma das pessoas ronca e penso, 'jamais conseguirei dormir nesse lugar'. Olho no 'mapa' para ver a localização da minha cama, tiro ela um pouco do lugar e o Jan fala que eu fico querendo me deslocar do grupo. Saio para dar uma volta, vejo o mar de Ibitipoca (?), estou ausente do mundo, num refúgio de paz e tranquilidade.

- corta -

Estou no Rio de Janeiro (ou São Paulo), no 'novo metrô' com algumas amigas da faculdade. O novo metrô é algo parecido com uma maria-fumaça européia (très charmant!). É meu aniversário, todos cantam parabéns no vagão. Não sei exatamente para onde estou indo, mas tenho que atravessar a linha do trem de bicicleta, olho várias vezes para me certificar de que não serei atropelada por um trem. No final das contas entro no trem que é "circular" (teoricamente ele voltaria para o mesmo ponto de partida) mas quando me dou conta ele está indo para bem longe (nilópolis, mas com o parâmetro de distância paulistano). Já que estou a passeio paro na estação 'sublimação', acho interessante o nome e tiro uma foto debaixo da placa. Meus amigos vão saltando a cada estação, eles sabem para onde querem ir e eu não. De repente me dou conta de que estava com uma bicicleta e me pergunto onde estaria ela agora. Lembro de Ibitipoca, lembro que tenho horário para estar em algum lugar e ainda tenho que passar no armário da estação para pegar alguma coisa que tinha deixado por lá.... ( aqui começa uma tonalidade de angústia).

Fim de sonho

sábado, 10 de novembro de 2007

O shopping e a galinha

Aperto o botão para chamar o elevador e enquanto aguardo, três distintas jovens se aproximam e também apertam o botão para chamar o elevador. Uma delas diz que quando criança adorava esses elevadores panorâmicos, mas que agora, por conta de seu medo de altura, tinha fobia de entrar nessas maquininhas. Entramos no elevador e outra jovem - a loira - conta que viu seu ex com uma camisa que ela havia dado pra ele, e o pior de tudo é que ele estava com outra mulher, e levantou a blusa assim e ela (a outra) ficou lambendo a galinha que tinha no peito dele. Tudo muito sórdido. Como ela fora capaz de namorar um canalha desses?